O COVID-19 como Agente de Mudança?

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O COVID-19 como Agente de Mudança? Ou Oportunidade Perdida?| Reforma Agrária

Um estranho vírus com nome de robot - COVID-19 - aterrou, de um dia para o outro, na nossa vida e reduziu drasticamente a velocidade da roda gigante, que nos mantinha alienados e numa eterna correria conta o tempo.

Parar e Refletir, ou demasiado Tempo?

Perante isto, homens e mulheres, que antes andavam a girar na roda, pararam atordoados e reagiram de modos diversos:

  • Uns começaram a ler tudo sobre o vírus, num desespero tão desenfreado quanto o da sua vida anterior, e trataram de criar regras e mais regras, para si próprios e para os familiares e vizinhos. Entre as idas e vindas de aprovisionamento na farmácia, no hipermercado; os telefonemas para o take-away e a necessidade de seguirem atentamente todos os novos desenvolvimentos do COVID-19, conseguiram ocupar novamente todo o seu tempo, em actividades, evitando assim entrar em rota de colisão com a sua falta de tempo para reflectir e pensar no abrandamento da roda. Para estes a realidade não mudou e o mundo não parou.
  • Outros descobriram pela primeira vez, que as relações humanas são mais complexas do que julgavam, e gostaram ou odiaram e passaram a dedicar-se de forma positiva ou negativa, a essa nova faceta da sua vida. 
    Olharam, como se fosse a primeira vez, para os filhos, os pais e os irmãos, porque finalmente tinham tempo para partilhar com eles, mas perceberam, que não podiam sequer estar com alguns deles, por causa do maldito vírus que virou tudo do avesso e alterou a normalidade das coisas.
  • E outros ainda começaram a pensar num novo modelo de sociedade, que contemple todos, que proteja todos, e em que todos contem e estejam inseridos como membros válidos e participantes da sua própria realidade social e familiar.

Novos modelos e valores

O COVID-19 obrigou-nos a repensar e redefinir:

  • os nossos valores e o nosso modo de vida; 
  • as nossas relações sociais e familiares;
  • os nossos conceitos de segurança, saúde e de bem-estar.
  • a nossa relação com o espaço casa

E, até, a nossa própria definição de felicidade. 

Questionar modelos estabelecidos

O COVID-19 como Agente de Mudança? Ou Oportunidade Perdida?| Reforma Agrária

Sobretudo, levanta-nos dúvidas sobre os modelos económicos e sociais estabelecidos, e maioritariamente aceites como norma, nomeadamente os nossos modelos de sociedade e de família - baseados na terceirização dos cuidados aos nossos familiares mais vulneráveis (crianças e idosos), em detrimento da coesão e cooperação familiar. 

E, que, nos colocam perante problemas avassaladores, tais como:

  • a morte, em solidão total, dos idosos em lares assépticos e até, por vezes, luxuosos, onde nãolhes faltam com nada, mas falham no maior luxo de todos, que é a qualidade de vida social e emocional desses idosos. 
  • o desenraizamento familiar e social das crianças, que vítimas de uma sociedade "sem tempo", são despejadas quase à nascença em autênticos depósitos, e cuidadas em espaços  "pão-de-forma", asséticos e cinzentões, onde as árvores  e a vegetação são eliminadas para dar lugar a campos de jogos com piso artificial e escorregas de plástico.
    Espaços onde se ensinam as crianças  a serem uniformes nos gostos e nos pensamentos.
    Espaços que preenchem o tempo das crianças com actividades extra-curriculares, para rentabilizar a mensalidade da criança, deixando-as sem tempo para brincar com os avós, com os tios ou com os primos, que por sua vez também andam a correr de actividade em actividade, como ratinhos tontos numa roda gigante, que nunca pára, para lhes dar tempo de pensar.
  • A impotência dos pais, filhos e netos - crianças, adolescentes, homens e mulheres, que são solicitados pela sociedade, pelo emprego, pela escola, pelo estado, pela comunidade, pelos media, pelo marketing, pelas grandes corporações globais,etc... a desempenhar tantos e tão incompatíveis papeis, que se sentem perdidos, aturdidos e incapazes de gerir o seu tempo, os seus próprios desejos e até as mais simples tarefas do seu dia-a-dia, sem o auxílio de ansiolíticos, anti-depressivos e outras "muletas" que os vão aguentando física e psicologicamente, como verdadeiros autómatos.  

Este é um desafio, eu diria até, o principal desafio que esta pandemia nos trouxe: afrouxar este modelo, cada vez mais desumanizado de sociedade, que estavamos a criar e, no seu lugar, recriar modelos de desenvolvimento económico e social, mais sustentáveis e, ainda assim, economicamente viáveis.

Uma questão de perspectiva

Manter a pandemia sob controle, numa sociedade que há muito substituiu a fé na religião, pela fé na ciência, é apenas uma questão de tempo, logo, um elemento pouco significativo, para a evolução da nossa espécie. 

Mas quanto tempo?

Esta não deixa de ser uma questão importante para a estabilidade económica e social. 

Mas, para a estabilidade pessoal e familiar de cada cidadão, é ainda mais importante, perspectivar esta pandemia, como uma oportunidade para redefinir a sua equação da felicidade e realização pessoal.

Procurar equilibrar os pesos, na balança da sua contabilidade pessoal, de forma a ajustar-se a um mundo, que não voltará a ser igual.

Seja porque nele falta o contributo de muitos que nos eram queridos e partiram antes do seu tempo, sem termos a possibilidade da despedida.

Seja porque vimos os nossos projectos, empregos ou empresas transformados em pó.

Talvez esta pandemia, tendo já revolucionado as nossas vidas, possa contribuir para uma (r)evolução natural, que nos liberte  da nossa anestesia coletiva e nos leve a questionar os nossos modelos e a exigir - aos políticos, aos fundos, às empresas e a nós mesmos - um Modelo de Sociedade mais Humanizado e mais Sustentável!  

  • Os nossos modelos alimentares ( baseados na importação massiva de produtos, que em muitos casos são passíveis de produção local, com vantagens para a comunidade)
  • Os nossos modelos de comercialização de produtos alimentares ( baseados numa estrutura pesada, em que: quem produz pouco recebe pelo seu esforço e quem compra pouco recebe de frescura e qualidade alimentar, apesar do que paga )
  • Os nossos modelos de vida (baseados no consumo em quantidade, mas sem qualidade e sem sustentabilidade)
  • Os nossos modelos de lazer, nomeadamente o nosso impeto de viajar em quantidade, mas sem qualidade, nem sustentabilidade)

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Mariana Barbosa

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